sábado, 20 de outubro de 2012

José Serra padece da ‘síndrome da contramão’

José Serra enfrenta na eleição municipal de São Paulo um conjunto de sintomas que, por reincidentes, assemelham-se a uma síndrome política –a síndrome da contramão. Pela terceira vez em dez anos, Serra vê-se compelido a remar contra a vontade de parcela expressiva do eleitorado.

Em 2002, Serra foi o presidenciável da continuidade numa fase em que, desgostoso com o governo tucano de Fernando Henrique Cardoso, o brasileiro ansiava por mudança.  Medida pelo Datafolha, a taxa de aprovação de FHC no ocaso do seu segundo mandato era miúda: apenas 26% dos brasileiros consideravam-no ótimo ou bom. Avaliavam-no como gestor ruim ou péssimo 36%.

Contaminado por essa atmosfera de enfado, Serra tornou-se à época o candidato favorito a transformar Lula em presidente da República. Após amargar três derrotas –uma para Fernando Collor e duas para o próprio FHC— o ex-sindicalista chegou finalmente ao Planalto.

Em 2010, Serra disputou de novo Presidência. Novamente na contramão. Dessa vez, foi o candidato da oposição numa quadra em que o encantamento despertado por Lula instilava na alma dos eleitores o desejo da continuidade. Ao final do seu segundo ciclo, Lula foi brindado pelo Datafolha com uma taxa recorde de aprovação: 83%. Cavalgando esse índice, ele fez da novata Dilma Rousseff sua sucessora.

Decorridos dois anos, Serra frequenta a cena eleitoral de São Paulo agarrado à âncora de uma administração que a grossa maioria dos paulistanos trama afogar. O Datafolha informa que 88% do eleitorado quer um prefeito capaz de implentar no município providências diferentes das adotadas por Gilberto Kassab (PSD).

Serra percorre em 2012 a via que lhe sobrou –para 2014, o PSDB irá de Geraldo Alckmin no Estado e de Aécio Neves no plano federal. Ou seja, não havia outro caminho. O problema é que, uma vez mais, Serra trafega a avenida certa na mão errada. Patrono e aliado de Kassab, traz gravado na testa a cruz da continuidade. Isso numa hora em que grassa o sentimento de mudança.

Dispersa, a fome de novidade carreou votos para três candidaturas no primeiro turno: Fernando Haddad (28,98%), Celso Russomanno (21,6%) e Gabriel Chalita (13,6%). Juntos, os pregoeiros do novo amealharam 64,18% dos votos, mais do que o dobro da votação obtida por Serra: 30,75%.

De resto, uma expressiva massa de paulistanos expressou sua aversão a todas as opções levadas pelos partidos à prateleira. Votaram em branco, anularam o voto ou abstiveram-se de comparecer às urnas 28% dos eleitores de São Paulo.

Contra esse pano de fundo impregnado de acidez, Serra chega à beira da definição em situação que, mal comparando, faz lembrar 2010. Mede forças com uma espécie de Dilma de calças. Lula não conseguiu eletrificar seu novo ‘poste’ na voltagem pretendida. Haddad não alcançou nem o terço de votos que os petistas historicamente beliscam na cidade. Mas foi ao segundo round.

Para desassossego do tucanato, Haddad beneficia-se agora do efeito mal menor. Revela-se aos eleitores de Russomanno e de Chalita como uma alternativa mais atraente –ou menos repelente— do que Serra. Abriu uma vantagem de 17 pontos. Deve-se a distância mais à queda do tucano do que à subida do petista.

Com Kassab peundurado ao seu pescoço e rejeitado por 52% dos eleitores, Serra frequenta o ringue como um candidato nas cordas. É como se participasse de uma luta de boxe na qual tivesse de entrar com a cara. Para prevalecer, depende de um nocaute.

Há na praça, informa o Datafolha, um naco de 19% do eleitorado à espera de ser seduzido. Um recorde. Em pesquisa feita a dez dias do segundo turno, 10% dos paulistanos declaram que votarão em branco ou anularão o voto. Outros 9% apresentam-se como indecisos. Para conquistar essa gente, Serra teria de operar um milagre.

Há um quê de ironia na ligação do tucano com o rejeitado Kassab. Em marco de 2004, quando se preparava para disputar a prefeitura de São Paulo, Serra recebeu em sua casa o deputado federal que o então PFL escolhera para ser o vice de sua chapa. Era Kassab. Com a franqueza que lhe é própria, Serra disse ‘não’. Receava que o vinculassem a Celso Pitta, de quem Kassab fora secretário.

Puxa daqui, estica dali o ex-senador Jorge Bornhausen, que presidia o PFL à época, foi para o tudo ou nada. Ou Kassab seria o vice ou Serra não teria o tempo de tevê da legenda. Eleito, Serra renunciou à cadeira de prefeito 15 meses depois, entregando o assento ao vice Kassab.

Em 2008, já no governo de São Paulo, Serra conspirou contra o candidato do seu partido à prefeitura, Geraldo Alckmin. Preferiu prestigiar o projeto reeleitoral de Kassab, que foi ao segundo turno contra Marta Suplicy e derrotou-a em votação consagradora: 61% dos votos.

Hoje, Serra tenta sustentar a tese segundo a qual o ex-vice tornou-se um político “autônomo”. O eleitor observa a cena e leva o pé atrás. Enxerga um político na contramão. Confirmando-se o quadro esboçado pelas pesquisas, Serra arrisca-se arrostar um infortúnio na cidade que lhe servia de lenitivo. Em 2002 e 2010, anos em que foi acometido pela síndrome, obtivera em São Paulo –na cidade e no Estado— mais votos do que Lula e Dilma.
 Fonte: Blog do Josias


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